Numa sessão polêmica, marcada por protestos e tumultos, os deputados estaduais derrubaram, por 18 votos a 8, o veto do governador ao projeto de Lei Escola Livre. O projeto que pretende garantir a neutralidade dos professores em sala de aula, explicita na justificativa da lei a necessidade de evitar que os professores tentem “obter a adesão dos estudantes a determinadas correntes políticas e ideológicas”, diz o texto.
Segundo as entidades sindicais dos professores, o que realmente está por trás da Lei é uma censura ao exercício da docência, uma tentativa de controle ideológico dos professores, inclusive com penalização dos que forem denunciados baseando-se nela. Apesar da derrubada do veto, os movimentos sociais pretendem recorrer à justiça contra a Lei que consideram inconstitucional por ferir princípios da Lei de Diretrizes e Bases da Educação.
Durante toda a terça-feira (26), quando aconteceu a votação, uma tenda colocada pelo Sindicato dos Trabalhadores em Educação (Sinteal), na praça Dom Pedro II, em frente a Assembleia Legislativa, recebeu representantes de entidades e movimentos contrários à Lei, denominada por eles como “Lei da Mordaça”. Estavam presentes vários professores e estudantes da Universidade Federal de Alagoas, que criticam o texto apresentado pelo deputado Ricardo Nezinho.
Segundo a professora Elvira Barreto, vice-coordenadora do Núcleo Mulher e Cidadania da Ufal, e pesquisadora sobre a questão de Gênero e Diversidade Sexual, a Lei representa um retrocesso na formação de cidadãos capazes de conviver com as diferenças. “É uma Lei muito perigosa, porque fere o princípio da liberdade que rege o sujeito moderno e vai de encontro ao livre pensar e à uma educação para a vida. Com essa Lei o educador pode ser processado por abrir espaço em sala de aula para reflexões plurais sobre a sociedade, a religião e a política”, questiona a pesquisadora.
Uma das críticas mais destacadas pelos educadores contrários à Lei é que a norma tira a legitimidade do professor como facilitador do conhecimento em sala de aula. A professora Maria Aparecida Batista, que coordena o Núcleo Mulher e Cidadania, ressalta o prejuízo para a educação que a proposta representa. “Essa Lei amordaça o professor em sala de aula. É retirada do professor a liberdade de exercício da práxis pedagógica nas questões que se referem à gênero, à diversidade sexual e religiosa. Discutir essas questões em sala de aula faz parte da formação ética e cidadã, pensando em uma sociedade plenamente democrática e sem opressão”, reflete a professora.
A professora Andréa Pacheco, do Grupo Frida Kahlo, da Faculdade de Serviço Social da Ufal (FSSO), que estuda Gênero, Feminismo e Serviço Social, diz que o conhecimento não deve se basear em dogmas, mas na metodologia científica. “Nós tivemos muitos avanços no século 18, com o iluminismo, e não podemos agora sofrer esse retrocesso, voltando à idade das trevas, pregando um conhecimento que não tem base científica, centrado em valores conservadores. Essa é uma lei autoritária e antidemocrática. Como disse Paulo Freire, a educação é um ato político”, reafirma a professora.
Em relação ao aspecto do respeito às etnias que formam a nação brasileira, a professora Clara Suassuna, diretora do Núcleo de Estudos Afro-brasileiros (Neab), ressalta que essa Lei não pode ser admitida. “É um total desconhecimento das diretrizes da Lei de Diretrizes e Bases da Educação [LDB], que defende o respeito à diversidade cultural, étnica e religiosa do Brasil. Os parlamentares precisam conhecer melhor os princípios da educação que foram formulados em profundos e ricos debates dos educadores brasileiros”, concluiu Suassuna.