Funcionário de um hospital de Maceió, demitido após ter sido diagnosticado com câncer, teve reconhecido na Justiça do Trabalho o direito de ser reintegrado à função e de receber o pagamento dos salários referentes ao período de afastamento, bem como o restabelecimento imediato do plano de saúde. A decisão foi proferida no mês de abril pelo juiz do trabalho substituto da 2ª Vara de Maceió, Flávio Luiz da Costa. O magistrado também condenou a empresa a pagar indenização de R$ 23 mil por danos morais ao reclamante.
Em sua decisão, Flávio Costa ainda fixou multa de R$ 5 mil, reversível ao próprio trabalhador, em caso de a empresa não o reintegrar e não restabelecer de imediato seu plano de saúde. Na ação, o trabalhador alegou ter descoberto a enfermidade em 2013 e, por conta disso, foi afastado e passou a receber auxílio doença. Em seguida, o INSS o declarou apto ao trabalho. Segundo ele, ao retornar ao trabalho, foi-lhe concedido um período de férias e depois ocorreu a dispensa sem justa causa e com aviso-prévio indenizado.
O trabalhador argumentou que sua demissão teria sido discriminatória e arbitrária, pois a empresa resolveu despedi-lo mesmo estando doente e no momento que mais necessitava. Também frisou estar em idade produtiva e que precisa se tratar contra os efeitos da doença para tentar prover o próprio sustento e o de sua família. Desse modo, salientou que a demissão o impediu de fazer previsões ou planejamento para o futuro.
O empregador destacou que a neoplasia adquirida pelo trabalhador é bastante delicada e demanda certos cuidados. Em sua defesa, enfatizou que o reclamante jamais sofreu qualquer conduta discriminatória por conta do problema de saúde. Ainda justificou que o motivo da demissão ocorreu pelo fato de ele ter laborado de forma insubordinada e devido ao seu mau comportamento. Também afirmou ter recebido diversas reclamações em relação à conduta do empregado em seu ambiente de trabalho, inclusive dos usuários e médicos do hospital.
Todavia, o juiz Flávio Luiz da Costa observou que os documentos trazidos ao processo são provas inequívocas da enfermidade e da necessidade de tratamento antes mesmo do afastamento e da dispensa do empregado. Segundo o magistrado, o ordenamento jurídico brasileiro, como um todo, repele intensamente atitudes discriminatórias contra trabalhadores.
“Nessa esteira, os pretórios trabalhistas vêm adotando o entendimento de que a dispensa sem justa causa de empregado, nas circunstâncias como as que se mostram presentes, decorre de postura discriminatória, salvo se comprovada, cabalmente, a motivação disciplinar, técnica, econômica ou financeira, que, no caso, não foi demonstrada nos autos”, avaliou Flávio da Costa.
Costa considerou que competia ao hospital comprovar que a dispensa do trabalhador teve motivação diversa da presumida discriminação. “Beira a litigância de má-fé da empresa ao aduzir hipóteses como dispensa por insubordinação e mau comportamento, que justificariam a dispensa do obreiro por justa causa, quando a própria o dispensou sem justa causa, conforme farta documentação trazida aos autos”.
De acordo com o magistrado, não há notícias de que o obreiro tenha sido advertido ou suspenso. Assim, em sua avaliação, ficou claro que houve dispensa sem justa causa e discriminatória pela doença apresentada.
Convenção – Flávio Luiz da Costa também reforçou sua decisão em observância à Convenção 111 da Organização Internacional do Trabalho (OIT). Em sua sentença, registrou que, além de o ordenamento jurídico vedar qualquer tipo de discriminação que tenha por objetivo reduzir ou limitar as oportunidades de acesso e manutenção do emprego, há normas internacionais que também devem ser observadas. “Dentre elas, a Convenção 111 OIT, que considera discriminação toda distinção, exclusão ou preferência que tenha por finalidade alterar a igualdade de oportunidade ou tratamento em matéria de emprego e profissão”, acrescentou.
Entre os precedentes jurídicos que embasaram sua decisão, Costa registrou várias súmulas análogas à ação, a exemplo da editada sob o número 443, do TST, que presume como discriminatória a despedida de empregado portador do vírus HIV ou de outra doença grave que suscite estigma ou preconceito. Inválido o ato, o empregado tem direito à reintegração no emprego.
O magistrado também usou como precedente a Lei 9.029/1995, que determina, em seu Art. 4º, que o rompimento da relação de trabalho por ato discriminatório, além do direito à reparação pelo dano moral, traz a faculdade de o empregado optar entre a reintegração com ressarcimento integral de todo o período de afastamento, mediante pagamento das remunerações devidas, corrigidas monetariamente e acrescidas de juros legais, ou a percepção, em dobro, da remuneração do período de afastamento, corrigida monetariamente e acrescida dos juros legais.
PROCESSO Nº 0000282-23.2016.5.19.0002