‘Eu bebi e dirigi’, diz ex-deputado Carli Filho sobre acidente com dois mortos

RPCEx-deputado estadual Fernando Ribas Carli Filho

Ex-deputado estadual Fernando Ribas Carli Filho

“Eu errei sim. Eu bebi e dirigi. Meu Deus, se eu pudesse voltar atrás.” A frase do ex-deputado estadual Fernando Ribas Carli Filho, dita em um vídeo divulgado pela defesa dele, quebra um silêncio que completa sete anos neste sábado (7). Em 2009, ele se envolveu em um acidente que culminou nas mortes de Gilmar Yared, de 26 anos, e Carlos Murilo de Almeida, de 20. 

Desde aquela data, o ex-deputado nunca se pronunciou publicamente sobre o acidente. O vídeo foi obtido em primeira mão pelo colunista Reinaldo Bessa, do jornal Gazeta do Povo. Em pouco mais de três minutos ele tenta se explicar pelo silêncio de quase uma década.

“Quero dizer que eu me mantive em silêncio tanto tempo por medo e muita insegurança. Fiquei muitos anos confuso, com tantos sentimentos diferentes, depressão, angústia e a necessidade de reagir para me recuperar. Enquanto eu tentava me situar novamente na vida, a repercussão desse assunto tomou uma proporção gigantesca, muito maior do que eu conseguia lidar”, disse o ex-deputado. Ele afirmou que passou todo esse tempo em silêncio porque tinha medo e se sentia inseguro.

Carli Filho relembrou do tempo de recuperação e disse que em momento algum tentou diminuir a dor que os familiares das vítimas sentiram. “Precisei dar conta da imagem que foi criada: a imagem de que sou um assassino de que não tenho sentimentos, que não sofri, que não me importei com nada, nem com ninguém. (…) “Eu tive todo o apoio da minha família. Me ajudaram a reaprender a andar e a falar. E a cada dia em que via a dor dos meus pais estampada em seus rostos, isso me torturava ainda mais. Eu entendia, dia a dia, a dor que provoquei neles e, pior, senti com desespero a dor dos pais que perderam seus filhos no dia da tragédia, sem ter tido, sequer, a chance de ajuda-los a se recuperar”, afirmou.

No vídeo, além de reconhecer ter bebido antes de dirigir, ele também se mostrou disposto a contar a própria história, para que casos semelhantes não aconteçam. “Eu sei que ninguém sai de casa para morrer, mas eu também não saí de casa naquele dia para matar ninguém. Eu mesmo quase morri. Sei que acidentes como esse acontecem todos os fins de semana. Quero ajudar a evitar isso”, afirmou, pedindo para que jovens não bebam antes de dirigir.

‘Desculpas à sociedade’
A mãe de Gilmar Yared, Christiane Yared, também divulgou um vídeo em resposta a Carli Filho. Em todos esses anos, ela luta na Justiça para que o julgamento do ex-deputado ocorra. Embora haja indícios de que, além de ter bebido, ele também estava em alta velocidade, o caso ainda não foi julgado nem em primeira instãncia. Ou seja, mesmo que seja considerado culpado, ele ainda poderá recorrer da sentença.

Christiane Yared lamentou que Carli Filho tenha divulgado o vídeo justamente no dia em que o acidente faz aniversário. “O senhor está um pouco atrasado para o enterro do meu filho. Tem sido muito, muito difícil. E o senhor foi desumano postar exatamente nesta data. Se o senhor precisa pedir perdão, é para a sociedade”, disse.

Ela também falou sobre o fato de Carli Filho ter reconhecido que bebeu antes de dirigir. Para ela, não se tratou de um mero acidente. “O senhor assumiu o risco. O senhor bebeu e bebeu muito. O senhor estava em altíssima velocidade. O senhor produziu o que produziu, duas mortes”, afirmou.

Em nenhum momento, Christiane fala sobre desculpar o ex-deputado. “Angústia, tristeza e as lágrimas, essas são nossas. Para o senhor, irá restar o Júri Popular. O senhor fala que sua mãe e seu pai sofrem. O senhor precisa ver o que acontece na minha casa. O senhor tem que ver o que acontece na minha casa para saber o que é sofrimento. Nós iremos nos encontrar logo, senhor Carli Filho, e será no Tribunal do Júri”.

Julgamento adiado
O  Júri Popular de Carli Filho estava inicialmente marcado para janeiro deste ano. No entanto, após recursos da defesa do ex-deputado, a data acabou suspensa pelo Supremo Tribunal Federal (STF).

Em fevereiro, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) rejeitou o último recurso da defesa e liberou o juiz de primeira instância a marcar o julgamento. Contudo ainda não há data definida para que Carli Filho seja julgado.

Leia a íntegra do depoimento de Carli Filho

Eu sou o Fernando Carli Filho e há sete anos me envolvi em um grave acidente de trânsito, onde morreram duas pessoas que eu não conhecia. Para mim, é muito difícil estar aqui agora. Quero dizer que eu me mantive em silêncio tanto tempo por medo e muita insegurança. Fiquei muitos anos confuso, com tantos sentimentos diferentes, depressão, angústia e a necessidade de reagir para me recuperar. Enquanto eu tentava me situar novamente na vida, a repercussão desse assunto tomou uma proporção gigantesca, muito maior do que eu conseguia lidar. E cada vez mais, eu ficava quieto, tentando digerir o que vinha. Além disso, precisei dar conta da imagem que foi criada: a imagem de que sou um assassino de que não tenho sentimentos, que não sofri, que não me importei com nada, nem com ninguém. E isso não é verdade. Eu sinto muito tudo isso que aconteceu. Eu errei sim. Eu bebi e dirigi. Meu Deus, se eu pudesse voltar atrás. Muito tempo se passou até que eu me sentisse pronto para falar. Durante esses sete anos, eu amadureci e repensei muita coisa dentro de mim. Eu quase morri. Passei por uma cirurgia de 14 horas, tive 64 fraturas e muito tempo para pensar em tudo. Eu tive todo o apoio da minha família. Me ajudaram a reaprender a andar e a falar. E a cada dia em que via a dor dos meus pais estampada em seus rostos, isso me torturava ainda mais. Eu entendia, dia a dia,  a dor que provoquei neles e, pior, senti com desespero a dor dos pais que perderam seus filhos no dia da tragédia, sem ter tido, sequer, a chance de ajuda-los a se recuperar. Como eu poderia vir a público falar? O que falar par esses pais? Como pedir desculpas para famílias que nunca mais verão seus filhos? Agora eu estou pronto para encontrar essas famílias e poder pedir perdão. Além disso, quero contar a minha história, para que outros jovens não façam o que eu fiz, beber e dirigir. Eu sei que ninguém sai de casa para morrer, mas eu também não saí de casa naquele dia para matar ninguém. Eu mesmo quase morri. Sei que acidentes como esse acontecem todos os fins de semana. Quero ajudar a evitar isso. Quero dizer que amo meus pais e agradecer por estarem sempre ao meu lado. Preciso terminar dizendo duas coisas para todos os que me escutam. Primeiro, desculpem o tempo em que eu fiquei em silêncio. Eu não consegui fazer diferente. E segundo, nunca dirijam depois de beber.

Leia a íntegra da réplica de Christiane Yared

Hoje completam sete anos da morte do meu filho. Sete anos de angústia, de dor e de luta. E o senhor vem em redes sociais me pedir perdão, a mim e a Vera? E diz que não quis produzir [as mortes], como se fosse um mero acidente. O senhor está um pouco atrasado para o enterro do meu filho. Tem sido muito, muito difícil. E o senhor foi desumano postar exatamente nesta data. Se o senhor precisa pedir perdão, é para a sociedade. E o Júri Popular é que vai dizer se o senhor é culpado ou inocente. E às vésperas do Júri Popular, o senhor vem às redes sociais e diz que não teve a intenção de matar e que sabe que meu filho e o amigo não saíram com a intenção de morrer. O senhor assumiu o risco. O senhor bebeu e bebeu muito. O senhor estava em altíssima velocidade. O senhor produziu o que produziu, duas mortes. Angústia, tristeza e as lágrimas, essas são nossas. Para o senhor, irá restar o Júri Popular. O senhor fala que sua mãe e seu pai sofrem. O senhor precisa ver o que acontece na minha casa. O senhor tem que ver o que acontece na minha casa para saber o que é sofrimento. Nós iremos nos encontrar logo, senhor Carli Filho, e será no Tribunal do Júri.

Fonte: G1

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