Eles podem permanecer por gerações no organismo e passar da mãe para o filho através da placenta. É possível também que causem desregulação hormonal, impotência, infertilidade, e má formação fetal. E mais, são produtos que aumentam o risco de desenvolvimento de câncer. Estamos falando dos agrotóxicos, produtos que, por lei, para serem vendidos e utilizados, precisam seguir uma série de normas e recomendações. A Fiscalização Preventiva Integrada do Rio São Francisco (FPI) faz um alerta sobre o tema e, em apenas três dias de trabalho, já recolheu mais de meia tonelada do produto.
É o Decreto-Lei nº 4.074/2002 que disciplina, no Brasil, a pesquisa, a experimentação, a produção, a embalagem e rotulagem, o transporte, o armazenamento, a comercialização, a propaganda comercial, a utilização, a importação, a exportação, o destino final dos resíduos e embalagens, o registro, a classificação, o controle, a inspeção e a fiscalização de agrotóxicos, seus componentes e afins. E é ele também que fala da necessidade do uso dos EPIs, os equipamentos de proteção individual.
Em seu inciso X, a legislação considera ‘Equipamento de Proteção Individual (EPI) todo vestuário, material ou equipamento destinado a proteger pessoa envolvida na produção, manipulação e uso de agrotóxicos’. “Eles são indispensáveis à segurança do trabalhador porque evitam que o produto seja inalado ou caia sobre o seu corpo. Se isso acontecer, a depender da classificação toxicológica, pode ocorrer a morte do paciente. Por isso não se pode descuidar”, alertou Paulo Melo, chefe do Núcleo de Agrotóxico da Agência de Defesa e Inspeção Agropecuária de Alagoas (Adeal).
“Quando as substâncias químicas contidas nos produtos entram no corpo humano, elas passam a produzir uma série de danos à saúde. Podem ser problemas respiratórios, doença de Alzheimer e até variados tipos de câncer. E a depender, por exemplo, da quantidade inalada num acidente envolvendo o agrotóxico, a traqueia fecha e, sem conseguir respirar, a pessoa vai a óbito”, acrescentou ele.
O Instituto Nacional do Câncer e a Fiocruz são as duas principais instituições que defendem o fim gradativo dos agrotóxicos, alegam que não existe dose segura para aplicar os produtos e também chamam atenção para outras patologias que podem surgir em função da contaminação: problemas hormonais, impotência sexual para os homens, infertilidade, transmissão de partículas químicas para os recém-nascidos através do leite materno e, ainda, a má formação do feto.
EPIs e classificação tóxica dos produtos
Os principais tipos de agrotóxicos são os inseticidas, que fazem o controle de insetos; os herbicidas, que são responsáveis pelo combate contra ervas daninhas; os fungicidas, utilizados para pôr fim aos fungos; e os bactericidas, que têm a função de acabar com as bactérias que invadem plantações. E eles estão divididos em quatro níveis de periculosidade: faixa Verde – pouco tóxico, faixa azul – medianamente tóxico, faixa amarela – muito tóxico e faixa vermelha – extremamente tóxico.
“Para manusear todos eles é obrigatório o uso dos EPIs. O trabalhador precisa estar protegido com respirador, luvas, botas de borracha, jaleco, avental, óculos e boné árabe (que protege cabeça e pescoço)”, detalhou Josean Leite, fiscal agropecuário e engenheiro agronômico.
“Porém, se por acaso ele não estiver com toda essa proteção, caso o produto cai sobre a sua pele, um banho forte, com bastante água, é a primeira medida a ser tomada. Já se o acidente envolver inalação, a vítima deverá procurar com a máxima urgência, levando o recipiente do agrotóxico, o hospital mais próximo para que uma equipe médica faça o processo de desintoxicação. Por isso é proibida a venda fracionada do produto. Quando ocorre esse fracionamento, as embalagens improvisadas não estão nem com a bula e nem com as explicações sobre os primeiros socorros e isso dificulta o atendimento de emergência”, alertou Josean Leite.
A utilização dos EPIs é obrigatória pelo Ministério do Trabalho, que regulamenta o assunto na Instrução Normativa nº 6. O trabalhador poderá ser demitido por justa causa caso se recuse a fazer uso dos equipamentos disponibilizados. Já o empregador é obrigado a fornecê-los sob pena de multas e processos. Todo EPI deve conter o certificado de aprovação do Ministério do Trabalho, que garante a qualidade do material.
As apreensões da FPI
Sabendo que essa é uma prática no interior de Alagoas, especialmente nas regiões do Agreste e Sertão, a FPI do São Francisco estabeleceu como uma de suas metas o combate contra a venda fracionada desses venenos. “Quando fazemos as abordagens, percebemos que muitos comerciantes desconhecem a legislação e daí a importância desse trabalho de orientação. Porém, há aqueles que sabem da proibição, entretanto, ainda assim, fazem a venda fracionada para poder ganhar mais dinheiro, haja vista que muitos donos de pequenas propriedades querem comprar menores quantidades do produto”, explicou a promotora de Justiça Lavínia Fragoso, coordenadora da Fiscalização Preventiva Integrada.
“Na verdade, a FPI atua em três frentes: explica que para vender o agrotóxico é preciso que o comerciante tenha registro na Adeal e a licença ambiental em mãos; depois, explicamos que os produtos não podem ser vendidos de forma fracionada e devem ficar armazenados em um depósito seguro; e, por último, apelamos para que eles façam o controle das embalagens, já que, também por lei, elas não podem ser reaproveitadas de forma alguma”, completou a promotora.
“O reaproveitamento dos recipientes é proibido porque, em suas paredes e no fundo, normalmente ficam resquícios das substâncias. E como muita gente do interior usa essas embalagens para guardar leite e água, acaba contaminando toda a família”, reforçou André Batalhini, assessor técnico do CREA, entidade que também compõe a FPI.
Toda loja de produtos agropecuários é obrigada a recolher as embalagens dos produtos vendidos. Depois, ela terá que devolver esses recipientes à central e recebimentos de embalagens de agrotóxicos vazias, localizada no município de Marechal Deodoro. Esse processo é chamado de logística reversa.
Fórum estadual
E O Ministério Público Estadual de Alagoas quer criar o Fórum Estadual de Combate aos Impactos dos Agrotóxicos. Uma reunião para discutir a formação do colegiado aconteceu, na sede do MPE/AL, no dia 14 de abri último. Também participaram do encontro mais quatro órgãos públicos estratégicos: Ministério Público Federal em Alagoas (MPF/AL), Agência de Defesa e Inspeção Agropecuária de Alagoas (Adeal), Instituto do Meio Ambiente (IMA) e o Conselho Regional de Engenharia e Agronomia do Estado de Alagoas (Crea-AL).
Após essa reunião, ficou estabelecida a data de 24 de maio próximo para a instalação oficial do Fórum, às 14h, no auditório do CREA. O Ministério Público aumentou sua preocupação com o uso indiscriminado dos defensivos agrícolas após a realização das quatro primeiras etapas da Fiscalização Preventiva Integrada da Bacia Hidrográfica do Rio São Francisco (FPI do São Francisco). Em todas as edições da FPI, as instituições que compõem a força-tarefa constataram a falta de conhecimento da população a respeito dos riscos envolvidos pela utilização dos produtos químicos.
É importante destacar que a instalação do colegiado contará com a presença de Pedro Serafim, coordenador do Fórum Nacional de Combate aos Impactos dos Agrotóxicos.