Vítima não consegue formalizar denúncia de perseguição e ameaça em Maceió

Jovem de 23 anos disse que sofreu para provar em duas delegacias de Maceió que estava sendo perseguida e confeccionar um B.O.

Ilustraçãomulher agredida

Após a repercussão em nível nacional do caso de perseguição envolvendo a modelo Ana Hickman, que culminou com a morte do agressor, ocorrido no mês de maio, ainda é difícil no Brasil para uma mulher denunciar qualquer caso tipo de agressão física ou psicológica nas delegacias especializadas, e assim, retornar mais tranquila para casa.

Em Maceió, a situação não é diferente. Marcela Oliveira *, uma jovem de 23 anos que está no último período do curso de medicina da Universidade Federal de Alagoas (Ufal), desde setembro de 2014 vem recebendo ameaças de morte e estupro, seja por telefone ou internet, de um ex-amigo que queria ter um relacionamento mais íntimo com a mesma. Após a negativa da estudante, o rapaz passou da condição de confidente para a posição de inimigo feroz.

Desde então, são dois anos de terrorismo psicológico até que a jovem passou a temer realmente pela vida nesses últimos meses de 2016. Quando as ameaças ultrapassaram a barreira do virtual e se tornaram reais, culminando em uma agressão física com um empurrão e um tapa, Marcela decidiu que precisava tomar uma atitude.

Leia também: Ana Hickman relata drama sob mira de fã: ‘ele veio pra cima de mim e começou a me ofender

Antes da decisão, durante todo esse tempo de perseguição, a estudante chegou a ser diagnosticada por um médico com transtorno de ansiedade e, desde então, toma regularmente medicamentos como Rivotril e Sertralina (ambos calmantes), o que prejudica substancialmente a conclusão do curso, já que a garota não consegue ter mais “cabeça” para os estudos.

Na última quinta-feira (16), ao ser convencida por amigos a revelar aos familiares a situação, a jovem buscou ajuda e fez o que manda toda cartilha da polícia: denunciar o caso. Ao menos tentou.

Depois de reunir as mais de 100 mensagens ofensivas registradas em suas redes sociais como prova e colocar tudo em um pendrive, Marcela teve de passar por uma via crúcis para conseguir ajuda.

A primeira parada foi na Delegacia da Mulher, que funciona no Centro. Ao tentar formalizar a denúncia, a jovem foi atendida por uma agente que não soube informar qual seria o procedimento a ser tomado.

“Ela não me tranquilizou em nada e foi bastante alheia à situação, não foi compreensiva e disse que esse não era um caso para Lei Maria da Penha. Para eu entrar com uma ação contra ele precisaria saber o endereço, fora isso nada mais poderia ser feito”, disse ela espantada.

A jovem tinha levado ainda o nome completo do suspeito, sua profissão e bairro, mas não sabia apontar exatamente qual a casa que ele reside. Sem orientação e confusa, a agente teria mandado ela retornar “quando tivesse mais clareza do que quer”.

Com poucas esperanças, a jovem procurou ainda uma delegacia localizada em Ponta Grossa. Ao chegar lá, a estudante teve outra surpresa. “Contei a história para um policial [homem] e de imediato tive que ouvir: ‘Quem mandou ser muito bonita’. Fiquei morta com aquilo. Quase desisti”, disse. Dessa vez ela chegou a ser atendida, mas novamente o B.O. não foi feito por conta da ausência do endereço do suspeito.

Delegada da Mulher estranha atendimento

A delegada da Mulher, Fabiana Leão, disse em entrevista ao Alagoas 24 horas estranhar a forma como a estudante foi atendida pela agente em sua delegacia. Segundo a delegada, nesse caso apresentado nada invalidaria a confecção de um B.O., pois a jovem detinha outras informações sobre o suspeito. ”Me estranha muito isso, e é até uma surpresa, a nossa orientação é que a mulher traga o máximo de informações possíveis. Se o caso é verossímil temos a obrigação de investigar”, destaca a delegada.

De acordo com Fabiana Leão, o que ocorre muitas vezes é o fato das vítimas chegarem nervosas e acreditarem que a polícia após ouvir a queixa sairá diligência imediata para efetuar a prisão do suspeito. “O que ocorre é que as pessoas chegam aqui nervosas e nós temos que ter tranquilidade, porque cada caso é um caso e nem sempre a pessoa recepciona da maneira que ela quer. Normalmente elas querem a prisão imediata”, salienta a delegada.

Ainda assim, afirma Fabiana Leão, nenhum B.O. deixa de ser feito somente por não haver um endereço certo do suspeito. “Isso não existe, a ocorrência é feita com os fatos que a mulher traz”, destaca.

É a partir do B.O. que o caso será encaminhado para investigação, a depender da gravidade, haverá ainda uma audiência preliminar onde o suspeito é convocado para prestar esclarecimento. A delegada ilustra ainda que diariamente 40 pessoas são atendidas por dia, e o essencial é que a denunciante leve o máximo de informações possível. “Por mês são em média 50 inquéritos fora os TCOS (Termos Circunstanciais de Ocorrência) que são aplicados quando não cabe a Lei Maria da Penha”, diz a delegada.

* O nome do personagem é fictício para preservar a integridade, inclusive, física da vítima.

Veja Mais

Deixe um comentário