O incêndio que atingiu um galpão da Cinemateca Brasileira na Vila Leopoldina, Zona Oeste de São Paulo, nesta quinta-feira (29) , começou em um ar-condicionado que passava por uma manutenção feita por empresa terceirizada contratada pelo governo federal, segundo informações iniciais do Corpo de Bombeiros. Uma faísca teria dado início ao fogo, e a empresa não conseguiu controlá-lo.
“O incêndio iniciou em uma manutenção de ar-condicionado. Uma empresa terceirizada do governo federal realizando uma manutenção. O principio de incêndio começou em uma das salas de acervo histórico de filmes que fica no primeiro andar. Então essa parte é dividida entre três salas, uma delas com acervo de filmes entre 1920 e 1940 e uma das salas de arquivo impresso, também histórico. Estamos levando o que foi queimado e preservado dentro dessas três salas, provavelmente nada. Porém, no andar térreo tem uma parte grande do acervo histórico que não foi atingida”, disse a capitã dos bombeiros Karina Paula Moreira à GloboNews.
Os bombeiros receberam um chamado de fogo em edificação comercial por volta das 18h na Rua Othão, 290. No endereço há um conjunto de galpões, de cerca de 6.356 m² de área construída, onde parte do acervo da Cinemateca Brasileira é guardado. O incêndio não ocorreu na sede da Cinemateca Brasileira, que fica na Vila Mariana. O fogo foi controlado por volta das 19h45.
A administração do órgão está sob responsabilidade do governo federal, por meio da Secretaria Especial de Cultura, em Brasília. Em nota, a secretaria informou que “todo o sistema de climatização do espaço passou por manutenção há cerca de um mês como parte do esforço do governo federal para manter o acervo da instituição”.
No prédio ficavam gravados 1 milhão de documentos da antiga Embrafilme, como roteiros, artigos em papel, cópias de filmes e documentos antigos. Alguns tinham mais de 100 anos e seriam usados na montagem de um museu sobre o cinema brasileiro.
Quinze viaturas com 70 bombeiros foram enviados para combater o fogo. Segundo o major Palumbo, porta-voz do Corpo de Bombeiros, no galpão há materiais altamente inflamáveis. Os bombeiros disseram ainda que a estratégia para combater o incêndio foi confinar o fogo, impedindo que ele se alastre para galpões vizinhos. Apenas o primeiro andar foi atingido.
“Nós temos o registro de ser um local onde temos diversos materiais combustíveis diferentes. Arquivos de filmes, que têm acetato altamente inflamável, e todos os materiais que compõem a edificação”, disse Major Palumbo.
Francisco Campera, diretor da Fundação Roquette Pinto, ex-gestora da Cinemateca, lamentou a situação em entrevista à GloboNews. “Quando entregamos a Cinemateca ao governo, em agosto do ano passado, eu cheguei a dar um depoimento ao Ministério Público Federal de que não era um ‘risco de pegar fogo’ era uma ‘tragédia anunciada’.”
Ele reforçou que o material do galpão é de alta combustão e citou a questão da conservação. “O último incêndio anterior a esse foi em 2016 [na Cinemateca da Vila Mariana] e tinha 13 pessoas do mais alto nível trabalhando de segunda a segunda e mesmo assim teve o incêndio. Porque precisa do monitoramento humano. Eu avisei aos funcionários que tomaram posse. Tem mais de um ano, e até hoje não tem monitoramento humano.”
Segundo Campera, “perdeu-se 4 toneladas de documentação da história do cinema brasileiro. Toda a documentação do Instituto Nacional de Cinema, da década de 60, até hoje da Secretaria Especial de Cultura, passando pela Embrafilme e pela Concine. Há também cópias de filmes, mas que já estavam em estado pior de conservação”, afirmou.
Em entrevista à TV Globo, a diretora-executiva da Sociedade Amigos da Cinemateca, Maria Dora Mourão, disse que o galpão atingido pelo fogo era o único em uso dentre os galpões da Cinemateca. No local são armazenados documentos e filmes de longas e curta-metragens, um “acervo relevante”, além de equipamentos.
No ano passado, um temporal alagou o galpão e parte do acervo foi comprometido. A instituição não revelou quais itens foram danificados.
O que diz a Secretaria Especial de Cultura
“A Secretaria Especial da Cultura lamenta profundamente e acompanha de perto o incêndio que atinge um galpão da Cinemateca Brasileira, em São Paulo (SP). Cabe registrar que todo o sistema de climatização do espaço passou por manutenção há cerca de um mês como parte do esforço do governo federal para manter o acervo da instituição. A Secretaria já solicitou apoio à Polícia Federal para investigação das causas do incêndio e só após o seu controle total pelo Corpo de Bombeiros que atua no local poderá determinar o impacto e as ações necessárias para uma eventual recuperação do acervo e, também, do espaço físico. Por fim, o governo federal, por meio da Secretaria, reafirma o seu compromisso com o espaço e com a manutenção de sua história.”
Abandono da Cinemateca
Em julho de 2020, o Ministério Público Federal em São Paulo (MPF-SP) entrou com uma ação na Justiça contra a União por abandono da Cinemateca Brasileira. A Promotoria questionava a falta de contrato para gestão da instituição.
O contrato para administração da Cinemateca firmado entre o governo federal e a Organização Social (OS) Associação Comunicação Educativa Roquette Pinto (Acerp) terminou no dia 31 de dezembro de 2019 e, desde então, não houve nova licitação. Desde 15 de janeiro, a Sociedade Amigos da Cinemateca faz a gestão da Cinemateca Brasileira até que uma nova organização social assuma a administração.