O Ministério Público da Bahia (MP-BA) pediu à Justiça a suspensão do registro da arma do jornalista Marcelo Castro, investigado por participar de um esquema criminoso conhecido como “Golpe do PIX”, que teria desviado dinheiro doado por telespectadores para pessoas em vulnerabilidade social.
Segundo a denúncia do MP-BA, o jornalista tem uma arma da marca Taurus, semiautomática, com situação ativa e válida. O órgão pediu ainda que o armamento seja recolhido em local determinado pela Justiça.
Na denúncia entregue à Justiça, o MP-BA pediu outras medidas cautelares não só para Marcelo Castro, mas também para os outros 11 investigados. Veja abaixo:
- Proibição de se ausentar de Salvador por mais de cinco dias, sem autorização da Justiça;
- Proibição de sair do Brasil;
- Determinação para recolhimento do passaporte à Secretária da 9ª Vara Criminal, no prazo de cinco dias, a partir da intimação para cumprimento da medida;
- Proibição de manter contato com as vítimas ou seus familiares, pessoalmente ou através de telefones, e-mails ou redes sociais;
O g1 entrou em contato com o Tribunal de Justiça da Bahia (TJ-BA) para saber se os pedidos foram aceitos, mas não recebeu resposta até a última atualização desta reportagem.
Bloqueio dos bens
As pessoas que foram lesadas pelos denunciados contaram suas histórias no programa “Balanço Geral Bahia”, na emissora TV Record/Itapoan, que não é alvo da investigação. As apurações dão conta que R$ 407.143,78 deixaram de ser entregues aos que participaram das reportagens e seriam beneficiados.
Para reparação dos danos, o MP requer seja fixada a quantia de R$ 607.143,78, a ser paga pelos envolvidos. A fim de garantir valores, o órgão solicitou o bloqueio de saldos de depósitos e aplicações financeiras dos principais investigados: os jornalistas Jamerson Oliveira e Marcelo Castro, além de Lucas Costa Santos. Os três teriam se apropriado indevidamente de boa parte do dinheiro doado por telespectadores. Não há informações se o pedido foi aceito pela Justiça.
O Grupo de Atuação Especial de Combate às Organizações Criminosas e Investigações Criminais (Geaco) entendeu que eles três, juntos com outras 9 pessoas, formaram uma associação criminosa, porém, o parecer do juiz da 9ª Vara Criminal da Comarca de Salvador alterou a classificação para organização criminosa, caracterização mais grave.
O g1 acessou a denúncia oferecida pelo MP-BA ao poder Judiciário e no documento são apontados os 12 casos investigados, conforme a ordem que cada um chegou para a promotoria.
Durante todo o período da fraude, o grupo arrecadou R$ 543.089,66 em doações, que deveriam ser totalmente repassadas às vítimas. Apenas 25% do valor arrecadado foi encaminhado corretamente, o que equivale a R$ 135.945,71. O grupo se apropriou de R$ 407.143,78, de acordo com o MP.
Entenda o modus operandi
👉 Segundo o MP-BA, a associação criminosa era chefiada por dois jornalistas.
- Um deles, na condição de repórter, apresentava os programas, entrevistava as vítimas, realizava os pedidos de doações e informava o número da chave PIX que aparecia na tela para receberem as contribuições, mesmo sabendo que estas não pertenciam aos entrevistados, mas sim outros integrantes da associação criminosa.
- O outro jornalista era o editor-chefe do programa, responsável pela transmissão. Ele autorizava a inserção e a exibição da Chave PIX destinada ao recebimento das doações, ciente de que pertencia a um dos integrantes do grupo criminoso, e não à vítima ou pessoa por ela indicada.
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A TV Record/Itapoan demitiu os dois então funcionários quando os casos vieram à tona. O g1 entrou em contato com a assessoria de comunicação da emissora e aguarda posicionamento.
As investigações apontaram que as ações criminosas se desenrolavam de maneira padrão. Confira como:
- As vítimas, no momento das entrevistas, acreditavam que a chave PIX informada era de titularidade da emissora ou de alguém ligado ao programa, até porque, aquelas que questionavam, eram assim informadas pelo denunciado, que as entrevistava.
- Sem terem acesso à informação do montante efetivamente arrecadado, satisfaziam-se com o valor recebido, e só tomaram conhecimento que os investigados tinham se apropriado da maior parte dos valores que lhes pertenciam quando os fatos foram divulgados pela imprensa.
- A fraude só veio a público após a apresentação do programa transmitido no dia 28 de fevereiro de 2023, quando foi exibida a situação de uma criança com grave problema de saúde e que precisava de ajuda.
- Na oportunidade, ocorreu uma doação realizada por um atleta, que não teve a identidade revelada, aos familiares da vítima. Posteriormente, uma pessoa ligada ao atleta, que tinha conhecimento da doação realizada por ele, assistiu ao programa, constatou que o PIX exibida na transmissão divergia da utilizada na doação efetuada pelo atleta, e ao simular uma transação, constatou a divergência de titularidade entre as chaves.
- Essa pessoa informou a situação para a emissora, que realizou levantamentos internos, identificou outros casos semelhantes e procurou Polícia Civil.
Mudança de Vara
Conforme o documento judicial, foi imputado aos integrantes do grupo “a prática dos crimes de apropriação indébita, lavagem de dinheiro e associação criminosa”. Entretanto, a vara afirma que trata-se, “na verdade e a princípio, de uma organização criminosa“.
A decisão destaca que a organização criminosa possui uma disposição mais hierárquica e organizada, enquanto a associação tem uma estrutura mais simples. Diante do exposto pelo MP-BA, a justiça considerou que o grupo formou uma organização, avaliada como estruturalmente complexa, muito ordenada e caracterizada pela divisão de tarefas.
Por esses motivos, o juiz titular da 9ª Vara Criminal da Comarca de Salvador determinou a remessa dos autos para que a Vara dos Feitos Relativos a Delitos Praticados por Organização Criminosa da capital baiana siga com os procedimentos, tendo em vista que o caso necessita ser acompanhado por uma unidade especializada