A recuperação do otimismo trouxe as montadoras de volta à porta do BNDES e lançou o banco em um inusitado desafio para poder emprestar dinheiro a esse setor. Passado o pior momento da crise, o apetite das montadoras é recorde.
Sob o efeito das vendas no mercado interno, impulsionadas pela redução do IPI (Imposto sobre Produtos Industrializados) e pelo aumento de crédito ao consumidor, as consultas das montadoras ao BNDES para investir em produção subiram 106% até abril ante igual período de 2008.
Primeira etapa de um pedido de empréstimo no BNDES, a consulta é tida como termômetro da atividade econômica porque mostra a disposição dos empresários em investir, o que só ocorre quando há otimismo com o mercado.
Entre as empresas com pedido no banco, está a GM. Quando a matriz, nos EUA, entrou com pedido de concordata, no início do mês, a subsidiária informou que manteria seus planos de investimento no Brasil –US$ 1,5 bilhão até 2012.
Para atender as montadoras, o BNDES vem analisando como impedir que a situação crítica das matrizes contamine a avaliação de capacidade das subsidiárias brasileiras de honrar o compromisso.
A saúde financeira das matrizes é avaliada pelos bancos ao emprestar a uma subsidiária de multinacional. O "dilema" do BNDES foi relatado recentemente por seu presidente, Luciano Coutinho. A preocupação é garantir crédito no momento em que as montadoras no país não poderão contar com suas matrizes combalidas pela crise.
De janeiro a abril, a indústria automobilística deu entrada em pedidos da ordem de R$ 3,4 bilhões, ante R$ 1,6 bilhão em igual período de 2008. Os empréstimos levam, em média, nove meses até a liberação.
O ritmo de crescimento supera o de consultas em geral no BNDES no período, de 34%, fechando em R$ 77 bilhões.
Segundo o banco, o ritmo das montadoras retoma os níveis de 2007 e surpreende pelo período em que ocorre. Geralmente, as consultas do setor crescem no segundo semestre.
O maior volume de pedidos de financiamento também se deve a um "represamento". Quando a crise se aprofundou, em setembro, montadoras, surpreendidas pela queda nas vendas no país e nas exportações, suspenderam investimentos.
Antes da crise, com os seguidos recordes de produção, montadoras chegaram perto do limite da capacidade de fabricação. Mas, com a queda na produção e nas vendas, voltou-se a ter uma margem. "A retomada dos níveis anteriores não deve ocorrer nos próximos dois anos", afirma Fábio Silveira, economista da RC Consultores. "O investimento faz sentido para o longo prazo."
A Anfavea (associação de fabricantes) diz que, de fato, os investimentos miram o longo prazo. A entidade prevê que, até 2013, o crescimento do mercado interno levará o país ao quinto lugar no mundo em produção –hoje é o sexto.
Apesar da crise global, as vendas de veículos leves ficaram estáveis entre janeiro e maio em relação ao mesmo período de 2008 –1,1 milhão de unidades. As vendas de caminhões caíram 19%. As exportações de carros caíram 46%, e as de caminhões, 67%.
Silveira faz uma alerta sobre os investimentos. "O Brasil está na mira de montadoras asiáticas já presentes aqui e de novas, que vêm com dinheiro próprio. O mercado deve ficar mais concorrido, o que pode não justificar a expansão da produção."