Em meio ao atrevido deboche do deputado José Carlos Aleluia (DEM-BA), que defende uma modesta reserva de mercado – “talvez para apenas um parente” -, o Brasil se despede da odiosa prática do nepotismo, o favorecimento a parentes, termo que tem origem na autoridade conferida a sobrinhos e outros parentes de papas na administração eclesiástica.
Aleluia, sem se dar conta do ridículo de sua argumentação, diz que em cidades pequenas, quase todos são parentes, o que serve apenas para chamar a atenção para a insustentabilidade de muitos municípios, onde o grande e quase único empregador é o poder público. Ele diz que a adoção de um sistema rigoroso de contratação pública inviabiliza a administração de municípios pequenos, quando, na verdade, estes o são por natureza.
Oxalá fosse o emprego de parentes a maior mazela do patrimonialismo brasileiro, mas a grande praga, que não pára de se espalhar, são as nomeações para cargos comissionados, chamados “de confiança”. Quase meio milhão de pessoas, só nas prefeituras das 5.564 cidades brasileiras. Somem-se a estas os postos nos demais Poderes e Estados e a cifra atinge inacreditáveis 850 mil servidores sem concurso, uma situação absolutamente injustificável; análoga, aliás, ao nepotismo.
Os quatro princípios constitucionais usados pelo Supremo Tribunal Federal para pulverizar de vez o favorecimento a parentes de ocupantes de cargos públicos aplicam-se em igual medida às nomeações em escala aluvional acima mencionadas. A exigência de concurso público é a garantia que se tem da aplicação equânime daqueles mandamentos constitucionais.
Não custa lembrar aqui que no governo Lula a coisa chegou ao paroxismo, quando o presidente criou, a pedido de seu vice José de Alencar, uma secretaria com status de ministério, informal e sarcasticamente conhecida como Sealopra, especialmente para abrigar quem classificara, com absoluta propriedade, seu governo como “o mais corrupto que o Brasil já teve”: o exótico filósofo Roberto Mangabeira Unger.
Provavelmente, nada é mais frustrante para os funcionários de carreira das empresas estatais do que a ocupação dos mais altos cargos por gente estranha, nas chamadas cotas dos partidos. Neste particular, é notório o enfeudamento de apadrinhados do PMDB nas companhias do setor elétrico, muitas cronicamente deficitárias, como a Companhia de Eletricidade do Amapá (CEA), Estado adotivo do senador José Sarney.
Há algum tempo, a Caixa Econômica e o Banco do Brasil se “reestruturaram”; a primeira substituiu cinco vice-presidentes por amigos do rei, e o BB dividiu a vice-presidência de Agronegócios e de Governo em duas e criou outra.
Agora, ante a descoberta de um possível oceano de petróleo no subsolo na costa brasileira, cogita-se a criação de uma estatal, apelidada “Petrosal”, – com poucos funcionários, sabe-se lá por que medidas, mas com muito poder – para usurpar algumas atribuições da Agência Nacional do Petróleo (ANP).
Por inacreditável que pareça o Estado brasileiro triplicou de tamanho nos últimos vinte anos, com gastos que superam um terço do Produto Interno Bruto (PIB).
Qualquer leitor minimamente atento já terá lido diversas vezes que o maior empecilho ao crescimento do País é justamente o tamanho do Estado, da máquina de governo, que também é a principal causa da inflação, porque ele é o maior consumidor.
O lema do governo federal, “Brasil, um País de todos”, tomado pelo valor de face, significa uma nação igualitária, sem apaniguados. Seria bom se fosse verdade…
Como se vê, há mais e muito maiores porteiras a serem fechadas pelo STF, mas é preciso que a sociedade se mexa, pois a Justiça é, por princípio, um poder passivo, que só atua quando provocado.