Dois anos e oito meses depois do incêndio na Boate Kiss, em Santa Maria, na Região Central, que matou 242 pessoas na noite do dia 27 de janeiro de 2013, o prédio onde funcionava a casa noturna ainda permanece interditado pela Justiça. Entretanto, a empresa proprietária do imóvel, a Eccon Empreendimentos de Turismo e Hotelaria, ainda mantém os planos de construir um hotel no local.
De acordo com o advogado da empresa, a ideia surgiu antes da tragédia no prédio. “Era um projeto que existia antes do incêndio, até porque o contrato deles (proprietários da boate) estava terminando. Tinha o projeto e investidores interessados”, explicou o advogado que representa a empresa, Paulo Henrique Corrêa da Silva.
Silva estima que o valor do prédio gire entre R$ 3 e R$ 4 milhões. Entre as destinações levantadas por familiares das vítimas após o incêndio estão a criação de um memorial para as vítimas e a desapropriação do local, por parte da prefeitura.
Mas o destino do local ainda é incerto, uma vez que o processo que apura a responsabilidade pelas mortes ainda está em fase de instrução, e por isso, a boate ainda pode ser palco de uma reconstituição que pode ajudar a esclarecer o que aconteceu no dia da tragédia.
“Tem esse projeto que ainda está de pé (da construção do hotel), mas desde o incidente o imóvel está interditado, está na mão do judiciário, que ainda vai definir o que vai ser feito até o final do processo. A reconstituição dos fatos seria o motivo que impede a liberação do local”, afirma o advogado, dizendo que fez uma petição à Justiça no dia 28 de setembro na qual solicita uma definição sobre o que será feito.
Ainda de acordo com Silva, enquanto o prédio está interditado, a empresa está contabilizando os meses de aluguel que devem ser cobrados dos responsáveis, além dos prejuízos provocados ao local por conta do incêndio e dos gastos com limpeza. “Ainda tem tempo para pedir o ressarcimento, até porque desde o incêndio o aluguel mensal segue correndo”, disse.
Entenda
O incêndio na boate Kiss, em Santa Maria, ocorreu na madrugada do dia 27 de janeiro de 2013. A tragédia matou 242 pessoas, sendo a maioria por asfixia, e deixou mais de 630 feridos. O fogo teve início durante uma apresentação da banda Gurizada Fandangueira e se espalhou rapidamente pela casa noturna, localizada na Rua dos Andradas, 1.925.
O local tinha capacidade para 691 pessoas, mas a suspeita é que mais de 800 estivessem no interior do estabelecimento. Os principais fatores que contribuíram para a tragédia, segundo a polícia, foram: o material empregado para isolamento acústico (espuma irregular), uso de sinalizador em ambiente fechado, saída única, indício de superlotação, falhas no extintor e exaustão de ar inadequada.
Ainda estão em andamento os processos criminais contra oito réus, sendo quatro por homicídio doloso (quando há intenção de matar) e tentativa de homicídio, e os outros quatro por falso testemunho e fraude processual. Os trabalhos estão sendo conduzidos pelo juiz Ulysses Fonseca Louzada. Segundo ele, o julgamento deve ocorrer até o final do ano. Sete bombeiros também estão respondendo pelo incêndio na Justiça Militar. O número inicial era oito, mas um deles fez acordo e deixou de ser réu.
Entre as pessoas que respondem por homicídio doloso, na modalidade de “dolo eventual”, estão os sócios da boate Kiss, Elissandro Spohr (Kiko) e Mauro Hoffmann, além de dois integrantes da banda Gurizada Fandangueira, o vocalista Marcelo de Jesus dos Santos e o funcionário Luciano Bonilha Leão. Os quatro chegaram a ser presos nos dias seguintes ao incêndio, mas a Justiça concedeu liberdade provisória a eles em maio de 2013.
Atualmente, o processo criminal ainda está em fase de instrução. Após ouvir mais de 100 pessoas arroladas como vítimas, a Justiça está em fase de recolher depoimentos das testemunhas. As testemunhas de acusação já foram ouvidas e agora são ouvidas as testemunhas de defesa. Os réus serão os últimos a falar. Quando essa fase for finalizada, Louzada deverá fazer a pronúncia, que é considerada uma etapa intermediária do processo.
No dia 5 de dezembro de 2014, o Ministério Público (MP) denunciou 43 pessoas por crimes como falsidade ideológica, fraude processual e falso testemunho. Essas denúncias tiveram como base o inquérito policial que investigou a falsificação de assinaturas e outros documentos para permitir a abertura da boate junto à prefeitura.