Desde pequenos ouvimos a preciosa instrução que até hoje não sei ser verdadeira, de que se por acaso estivermos no mar e surgir um tubarão, o ideal é ficarmos imóveis, sem movermos um músculo sequer, a fim de que o perigoso predador dos oceanos simplesmente nos ignore e vá embora – algo a ver com...
Desde pequenos ouvimos a preciosa instrução que até hoje não sei ser verdadeira, de que se por acaso estivermos no mar e surgir um tubarão, o ideal é ficarmos imóveis, sem movermos um músculo sequer, a fim de que o perigoso predador dos oceanos simplesmente nos ignore e vá embora – algo a ver com nossa vibração na água. Sei… Ou melhor, ÇEY…
Crescemos também ouvindo que devemos ter atitude e reagir sempre para enfrentar as adversidades que surgem em nossa vida, tomando as rédeas da situação, assumindo posturas e agindo com inteligência e sensatez. Então essa controversa instrução de ficarmos imóveis, sendo essa a ação – ou a inação – a tomar, vai contra os manuais de sobrevivência. Bom, espero jamais precisar experimentar essa teoria um dia.
Porém, existem de fato várias outras situações onde o melhor a fazer é simplesmente não fazer nada, não mover um mísero músculo e deixar o perigo, o sofrimento, o desconforto, a raiva, a frustração, a angústia, a saudade, o desespero, a dor, o tubarão, ou qualquer outra coisa negativa passar e ir embora para o fundo do oceano. As vibrações que provocamos na água com eventuais movimentos reativos podem agravar situações que sabemos serem momentâneas. Então, diante de algo assim, o ideal também é ficarmos imóveis enquanto os segundos, as horas ou os dias fazem seu papel: leva-os para bem longe de nós.
Lembro-me de um amigo que me contou certa vez que quando assolado por ataques flatulentos noturnos sob a espessa coberta providencialmente chamada de “abafa-bufa”, mantinha-se imóvel sem mover um músculo, para que o desagradável odor saído de suas entranhas, não vazasse quarto afora e adentrasse nas narinas delicadas de sua doce esposa, causando uma briga conjugal noturna. Ele então ficava lá imóvel, esperando o seu tubarão gasoso dissipar aos poucos, enquanto monitorava tenso a expressão serena de sua mulher deitada ao lado na leitura de um livro, alheia ao mal que se instalara e crescia sob as cobertas -afinal ele sabia bem quão furiosa ela ficava ao perceber sinais de flatulência no ar -com toda razão, diga-se de passagem.
Na verdade, são inúmeros os exemplos que podemos citar de situações onde o melhor a fazer é nada fazer – do tubarão à bufa noturna do meu amigo, do xingamento ouvido no trânsito àquela súbita vontade de explodir com algo ou alguém. Então, o ideal é tiramos nossa mente do modo natural e primitivo e acionarmos o modo racional, mesmo que pareça absurda a ideia – afinal, quantos de nós conseguiria ficar imóveis com um peixão dentuço e voraz sob os nossos pés, ou diante do calor dos gases querendo eclodir com uma mulher serena e com um olfato apuradíssimo ao lado?