Luis Vilar
Todas as postagens são de inteira responsabilidade do blogueiro.
Permita-me, caros leitores, dá uma pausa nos comentários políticos e em outros indigestos, para dividir com os senhores o pequeno milagre que me acompanha a cada dia, me devolvendo a esperança e a razão, quando todas as luzes se apagam.
Ela se chama Beatriz. Tem pouco mais de 85 centímetros, mas consegue me colocar dentro de suas mãos. Idade: quase três anos. Não sei como em tão curto tempo consegui esquecer como era a vida antes dela, porque hoje tudo só existe com ela aqui. Também não sei como ela consegue me surpreender todos os dias. As coisas de Beatriz – gestos, frases, travessuras, enfim – é universo mágico palpável, que me faz olhar para o mundo e sentir o quão precisamos trabalhar para deixá-lo um pouco melhor para quem ainda vem.
A singeleza e a inocência desconcertante (para mim, pelo menos) é o que mais me atrai. Acho que descubro mais com as perguntas que ela me faz, do que ela comigo. Beatriz é uma pequena poetisa perspicaz, que consegue enxergar em versos coisas que estão a anos-luz dos meus olhos saturados e – por vezes – desesperançosos. Esta semana, resolvi pegá-la pela mão para buscarmos minha esposa no trabalho. Lá vamos nós pelas calçadas da Avenida Álvaro Calheiros, em Mangabeiras.
Beatriz passa por uma porção de folhas amareladas caídas por uma das calçadas e trava comigo o seguinte diálogo:
– Pai, as folhas caem?
– Sim, elas caem das árvores Beatriz…
– Mas, por que elas precisam cair?
– Bia, as folhas caem para que outras folhas possam nascer em seu lugar. É assim. Elas dão espaço a outras.
– Hum rum (ela tem mania de fazer isto)
Depois de alguns segundos de silêncio, Beatriz retorna ao assunto
– Papai, então quando alguém nasce é porque alguém caiu?
Como se responde isto, pelo amor de Deus? É mais fácil as análises políticas que faço aqui diariamente. Ora bolas, há tantas entrelinhas em perguntas bobas. Pois bem, me flagrei filosofando sobre esta relação entre vida e morte todo o resto do caminho…
Na manhã de ontem, uma nova peripécia de Beatriz…
– Pai, me dá água
– Espero só um pouco filha, que eu pego já
– Mas pai, eu preciso de água
– Eu já vou pegar Bia
– Pai, e se eu secar todinha. Eu num vou nem mais chorar, nem fazer xixi. Nunca mais.
Só me restaram gargalhadas, para no final ainda ouvir: “ ‘Tá’ rindo de mim é? Eu sou engraçada é?”.
Pouco tempo depois, Beatriz do nada diz
– Pai, eu amo você. Mas, eu amo mais a mãe. Agora ontem, você me deu presente, aí eu amei mais você…
– Está querendo ganhar outro presente não é Beatriz?
– Quero não.
– Ainda bem, digo eu
– Mas você vai comprar o que para mim?, finaliza…
E assim seguem os diálogos com Beatriz dia após dia. Seriam inúmeros. Queria dividir alguns com quem me lê. Quem já tem filhos deve até se reconhecer. Para finalizar, só mais um…
Beatriz correndo pela casa e gritando: “Ui, chega meu Deus. Eu estou apertada. Eu quero fazer xixi. Eu quero fazer xixi. Aí, meu Deus. Abre o banheiro. Ai, ai, eu não entendo nada desta vida”…
Ás vezes nem eu entendo minha filha, nem eu…