Analisando as postagens políticas furiosas dos perfis que sigo no Instagram, sejam a favor do Bolsonaro ou a favor do Lula, percebi uma coisa curiosa, sobretudo entre os mais inflamados: os argumentos são sempre supostamente a favor do bem. Eu explico. Os apoiadores do atual presidente sentem-se no meio de uma cruzada ufano-religiosa defendendo...
Analisando as postagens políticas furiosas dos perfis que sigo no Instagram, sejam a favor do Bolsonaro ou a favor do Lula, percebi uma coisa curiosa, sobretudo entre os mais inflamados: os argumentos são sempre supostamente a favor do bem. Eu explico.
Os apoiadores do atual presidente sentem-se no meio de uma cruzada ufano-religiosa defendendo valores inquestionáveis, como Deus, família e pátria. Colocam-se de um lado da trincheira com a faca nos dentes para conter as hordas “comunistas” que pretendem a tudo e todos destruir. Querem também espalhar miséria, tomar os nossos bens, e, além do mais, impor uma sociedade sexualmente mais plural e “banda voou”, com gente que gosta mesmo é de moleza e dinheiro público. Como não ser contra tudo isso, meu Deus?
Já os que defendem o Lula e o PT, estão entrincheirados e armados com as melhores intenções possíveis, principalmente a de tornar a vida de todos bem melhor. Acreditam numa sociedade igualitária onde o Estado tem por obrigação aparar arestas sociais e econômicas, bem como incentivar e apoiar as diversidades de gêneros e raças, sempre corrigindo eventuais injustiças, contemplando as minorias com programas benevolentes e reparadores. Como ser contra tudo isso, meu Deus?
Acontece que, ideologias à parte, cada lado acha que está do lado do bem, e pela lógica, quem não está do lado do bem está do lado do mal. Sim, o Mal, que pode vir na figura de Lula, Bolsonaro, Stálin, Fidel ou o próprio Capirôto. E é aí que a coisa torna-se perigosa —quem acredita estar agindo sob o manto da verdade e do bem, imediatamente adquire um passaporte ou uma licença, para usar, quando necessário, medidas, digamos, mais extremas contra o suposto inimigo. A história nos mostra contextualmente onde isso nos leva.
Portanto, desafio ver alguém que assuma que suas escolhas não o faz pertencer ao lado do bem, ao lado dos cheios de boas intenções , mas sim por puro pragmatismo político e interesse pessoal. Por exemplo, se sou um funcionário público federal, geralmente agraciado com a generosidade dos partidos de esquerda, não preciso criar justificativas mirabolantes para explicar meu voto. Nem se sou conservador e adoraria me armar até os dentes para me defender dos bandidos, não precisaria usar explicações reducionistas e preconceituosas —afinal ninguém deveria acreditar que suas verdades sejam absolutas e tudo que delas divergem pertençam ao lado negro da força.
O importante então é entendemos que política não é um confronto épico do Bem contra o Mal —isso pertence ao campo das religiões e dos filmes de ação. Política é pragmatismo e vigilância, cobrança e informação -e quanto menos idolatria houver, melhor. Como não ser a favor disso, meu Deus ?