Luis Vilar
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10 de janeiro de 2008. Silêncio absoluto. Eu (Luis Vilar), a repórter fotográfica Sionelly Leite e o motorista Antônio Jorge Farias cortando a Avenida Fernandes Lima em um profundo silêncio absoluto dentro do carro. Para quem não sabe, o cotidiano de jornalista é extremamente estressante. Entre uma pauta e outra sempre há o excesso de brincadeiras e comentários dentro do veículo. Alguns até impublicáveis, é bem verdade, mas para aliviar o estressante dia-a-dia da violência, corrupção e outras mazelas que na maioria das vezes fazem a PAUTA.
Mas, hoje foi diferente. Ao sairmos da pequena casa humilde onde o garoto Leandro – de apenas 11 anos – havia sido assassinado à pauladas, não havia o que dizer. Não havia como digerir a cena de sangue por todos os lados, massa cefálica próximo a um gibizinho da turma da Mônica, juntamente com bilhetes que ainda ameaçavam a duas crianças: Hugo e Daniel.
Eu não sabia como escrever esta matéria. Ainda bem que não precisei. Passei as informações por telefone e ao chegar à sede do Alagoas 24 Horas, o texto já estava escrito. O silêncio dentro do carro me fez pensar muito. Acredito que as mesmas reflexões que meus companheiros de trabalho, não sei ao certo. No meu caso, um completo sentimento de abandono e medo. Não por mim, mas pelo que temos – falo de pais e mães – de mais sagrado: nossos filhos.
É aos pais e mães que me dirijo. Para qual tempo estamos entregando os nossos filhos? Ao se ver as atuais notícias é impossível não generalizar toda uma geração futura que se cria em meio a ausência de sonhos e de perspectivas. Há muito falo neste espaço sobre a ausência completa de valores que tem tomado conta do nosso cotidiano e mais uma vez ouso chamar a atenção para a banalização da violência.
Eu confesso que tenho dois medos: o primeiro, de não poder acompanhar de perto minha filha na Igreja, na escola e outros demais lugares que ela escolha ir. O segundo: que pelo medo que tenho, eu possa sufocá-la reprimindo a sua liberdade e a deixando com mais medo ainda e ausência de esperança. No entanto, em instituições religiosas são constantes as denúncias de pedofilia. Nas escolas, o tráfico de droga bate a porta. Em nossas casas, a qualquer momento uma invasão premeditada.
Na rua? Bem, na rua é um campo minado. Salve-se quem puder. O mundo de nossas crianças não lhes dá direito à infância. Ou as encarceramos ou as perdemos, mas se as encarcerarmos… estaremos perdendo um pouco delas também! Sendo assim, submetemos a beleza da infância ao MEDO: energia vital e motriz do mundo em que vivemos. Medo! Medo! Medo!
Pai da família: sinônimo de medo. Medo da violência. Medo pelos filhos. Medo de perder o emprego. Medo de ver a família se dissolver. Medo de não estar certo. Medo de não saber educar. Medo de prender demais. Medo de soltar demais. De não ser um Piaget. De não ser um carcereiro. De não ser ninguém… Medo de não servir de estrada para entregar nas mãos de seus filhos o futuro ao qual não teve direito.
Para quem sonhou muito um dia, vive hoje na sombra do futuro que não veio. A vida tem se tornado cada vez mais crua. O pequeno Leonardo ganhou as páginas de jornal. Quantos não aparecem? Foi a morte de João Hélio no Rio de Janeiro, Foi o garoto alagoano morto por traficantes dependurado em um orelhão. Foi Leandro, talvez morto por colegas de escola que foram flagrados fumando maconha, enfim…foi…foi…foi…aliás, vão ser quantos.
Mudar o rumo das coisas não é mais uma utopia. É uma urgência, uma emergência. Caso contrário, vão invadir a nossa casa lentamente – em uma violência travestida – que já roubou nossos sonhos, anda roubando nossa indignação e deixando de brinde a banalização de tudo e o conformismo. Daqui a pouco, esta mesma violência disfarçada em anúncios de jornais, conversas de vizinhos, jogos eletrônicos entre outros mecanismos, vai entrar em nossa casa e roubar o direito de ir e vir, a noção de que poderia ser diferente, a possibilidade de educarmos nossos filhos, o amor que ainda nos resta e temos…
Sabe o que vai sobrar? Um sorriso prazeroso na face depois de um filme sangrento que nem de longe se aproxima do mar vermelho da realidade. Além disto, um silêncio absoluto. Silêncio absoluto. Só que diferentemente do silêncio que se fez hoje no carro do Alagoas 24 Horas, este não trará nada de novo, sequer reflexão alguma. Será o mundo que vivemos e pronto. Se houver mais um cadáver na esquina, é algo natural, como a chuva. E assim vai, até chover sangue…
Enquanto isto…
…lembro de uma frase que li em uma fotografia na internet: “Urinam em nós e as autoridades dizem que chove”!