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O Esvaziamento da 17ª Vara Criminal da Capital

Mais uma vez posta em discussão a regulamentação da 17ª Vara Criminal da Capital. Depois de questionada a competência da 17ª Vara por um combativo advogado, o Presidente do Tribunal de Justiça do Estado de Alagoas defende a legalidade do órgão jurisdicional e reclama da inércia do Poder Legislativo no que se refere à apreciação do Projeto de Lei que adapta a atuação da vara especializada à decisão do Supremo Tribunal Federal, na Ação Direta de Inconstitucionalidade n.º 4414.

Por sua vez, o Presidente da Assembleia Legislativa de Alagoas afirma que a matéria não é consenso entre os deputados e tramita atualmente na Comissão de Constituição e Justiça da Casa de Tavares Bastos.

A sociedade, embriagada pelo discurso enganoso de que mais rigor na aplicação do direito penal seria o caminho para alcançarmos dias melhores, desde o julgamento da Corte Suprema que encurtou a competência da 17ª Vara, sente-se órfã de um órgão jurisdicional que representa o símbolo da repressão penal no Estado de Alagoas.

Penso que há de se aplicar, aqui, o adágio popular: “casa em que falta pão, todo mundo reclama e ninguém tem razão”. Explico.

O Supremo Tribunal Federal concluiu o julgamento da ação que questionou a constitucionalidade da 17ª Vara Criminal, retirando do texto legal vários artigos e dando interpretação conforme a outros tantos.

No entanto, naquele julgamento firmou-se o entendimento de que a criação da 17ª Vara Criminal era questão alusiva à organização judiciária local, o que justificaria que o parlamento alagoano legislasse sobre a matéria, admitindo inclusive a titularidade coletiva.

Sem embargo das críticas que possa merecer a decisão da Corte Suprema, o fato é que, após o julgamento da ADI n.º 4414, surgiu no mundo jurídico a lei federal n.º 12.694, de 24 de julho de 2012, que dispõe sobre o processo e o julgamento colegiado em primeiro grau de jurisdição, de crimes praticados por organizações criminosas. A introdução da lei no ordenamento jurídico nacional altera sobremaneira o panorama jurídico sob o qual até então se discutia a questão.

Segundo o referido diploma legal, o juiz natural, no caso concreto que se lhe apresente, “poderá” instaurar o colegiado, indicando os motivos e as circunstâncias que acarretam risco à sua integridade física, em decisão fundamentada, da qual será dado conhecimento ao órgão correicional.

Diz ainda a lei federal, que o colegiado será formado pelo juiz do processo e por 2 (dois) outros juízes escolhidos por sorteio eletrônico dentre aqueles de competência criminal em exercício no primeiro grau de jurisdição.

Ora, se há lei federal disciplinando a matéria, estabelecendo procedimento próprio para a instauração do incidente de colegialidade, poderia o legislador alagoano criar um órgão colegiado especial e afastar o juiz natural que foi preservado e prestigiado na lei federal?

Há duas posições acerca da questão. Para alguns, a Vara pode ser criada sim, uma vez que passaria a ser o juízo natural de todas as causas criminais que envolvessem crime organizado.

Embora reconheça que a tese possa ser sedutora, para mim ela não resiste a uma análise mais criteriosa. Penso que a Vara não poderia ser criada, pelo menos com titularidade múltipla, pois a instauração de colegiado em 1º grau é matéria excepcional, de natureza processual sim, que só pode ser disciplinada, como de fato já foi, por lei federal.

Mas seja qual for o entendimento que se adote uma coisa é certa: com o advento da referida lei federal fica patente a regra geral do juízo monocrático em 1º grau, admitindo-se a formação do colegiado somente se o juiz do caso, em decisão fundamentada, indicar motivos e circunstâncias que acarretem risco à sua integridade física.

Isso quer dizer que, mesmo admitindo a possibilidade de criação, por lei local, de uma vara especializada para tratar de matéria alusiva ao crime organizado, a titularidade não pode ser coletiva, uma vez que a instauração do colegiado não é automática, pressupondo a iniciativa do juiz natural.

Diga-se, ainda, que a lei federal estabelece que o colegiado será formado pelo juiz do processo e por dois outros juízes escolhidos por sorteio eletrônico dentre aqueles de competência criminal em exercício no primeiro grau de jurisdição.

Não há, portanto, segundo a lei federal, colegiado fixo e além disso os juízes sorteados têm competência limitada ao ato da convocação, ao contrário do que pretende o Projeto de Lei ora em trâmite na Assembleia Legislativa.

Constata-se, assim, que a lei federal ressalta a importância da preservação do juiz natural monocrático, cabendo somente a ele avaliar as circunstâncias do caso concreto e decidir acerca da formação do colegiado, o que gera, por conseguinte, o esvaziamento da 17ª Vara Criminal, pois na forma em que concebida, malgrado sirva ela ao modelo do direito penal do inimigo, é incompatível com a normatização advinda da lei federal.

Conclui-se, portanto, que é inócua a insistência em manter viva a vara especializada, que atua hoje sob escancarada ilegalidade.

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