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Que País é este?

Defensor público Mariano Lauria
Defensor público Mariano Lauria

No país do Fernandinho Beira-Mar, PCC, da guerra do narcotráfico, de organizações criminosas cada dia mais aparatadas e voltadas ao cometimento de um sem número de crimes gravíssimos, tais como, homicídios (típicos de grupos de extermínio), roubos a banco, extorsões mediante sequestro et coetera, nos perguntamos estarrecidos, o que fazer, qual o remédio eficaz?

Muitos responderão que devemos endurecer as leis penais, falam até na odiosa pena de morte, haja vista o Brasil ser conhecido como “o país da impunidade”. Contudo, será que essa é a melhor alternativa? Será que aqui ninguém vai preso?

Em um ambiente como este, pode, prima facie, parecer contraditório ou até mesmo antipático demonstrar – em que pese – com dados concretos do Censo Penitenciário Nacional, que a população carcerária cresceu de 148.760 pessoas em 1995, para 328.776 em 2005 (e hoje deve ser muito maior!).

Movimentos de “lei e ordem” crescem a cada dia em busca da tão propalada “segurança pública”. Nesta senda, parece que o Direito Penal é a resposta, a panacéia de todos os males, mas como tudo na vida, há de se ter cautela!

Inicialmente, devemos ter em mente o contexto social brasileiro, qual seja, de extrema desigualdade social. A economia cresce a conta-gotas (em que pese ter tido um aquecimento nos últimos anos), desemprego, miséria, analfabetismo, descontrole na natalidade, baixa qualidade na educação e saúde públicas, déficit habitacional, são todos temas recorrentes do nosso dia-a-dia.

No contexto político, observamos quase que diariamente, o apelo a medidas simbólicas de endurecimento das leis penais, onde não raras vezes, ferem-se de morte os direitos e garantias fundamentais dos investigados/acusados.

Ora, é de clareza solar que tais medidas apresentam um custo muito mais reduzido do que políticas públicas eficazes para a diminuição das desigualdades sociais, e ainda dão a – falsa- sensação tranqüilizadora à sociedade que atitudes efetivas foram adotadas no combate à criminalidade, atendendo assim, muito mais, aos interesses eleitoreiros do que ao bem comum propriamente dito.

Não queremos aqui fazer uso da palavra para pregar o abolicionismo penal, contudo, pretendemos, humildemente, colaborar com a construção de uma sociedade mais justa e igualitária a todos, sem nenhuma distinção maniqueísta tomada aprioristicamente – como, por exemplo, o "bom" e o "mau", ou a que está mais em voga no âmbito do Direito Penal contemporâneo, por mais contraditória que seja, o "cidadão" e o "inimigo"-, a qual deveria recorrer somente (e verdadeiramente) ao Direito Penal como a ultima ratio, pois, como assevera o inigualável penalista argentino Eugênio Raúl Zaffaroni: “enquanto os direitos humanos assinalam um programa realizador da igualdade de direitos de longo alcance, os sistemas penais são instrumentos de consagração ou cristalização da desigualdade de direitos em todas sociedades”.

Sendo assim, entendemos que a desenfreada inflação legislativa, tomada de afogadilho, sem a devida ponderação dos valores que estão em jogo, com o único propósito – ainda que velado – de recrudescimento das sanções e procedimentos criminais, as quais, muitas vezes, alijam direitos e garantias individuais dos investigados/acusados, que foram conquistados por intermédio de muita luta, após vários “anos de chumbo” promovidos pela odiosa ditadura militar, sendo, promulgados, bravamente, pela Carta Política de 1988, a chamada Constituição Cidadã, direitos e garantias estes que deveriam ser tratados como aquilo que temos de mais caro neste País, sob pena de um terrível e nunca antes visto retrocesso, pois, como advertiu o saudoso Ulysses Guimarães, Presidente da Assembléia Nacional Constituinte: "A Constituição certamente não é perfeita. Ela própria o confessa, ao admitir a reforma. Quanto a ela, discordar, sim. Divergir, sim. Descumprir, jamais. Afrontá-la, nunca. Traidor da Constituição é traidor da pátria. Conhecemos o caminho maldito: rasgar a Constituição, trancar as portas do Parlamento, garrotear a liberdade, mandar os patriotas para a cadeia, o exílio, o cemitério. A persistência da Constituição é a sobrevivência da democracia".

Mariano Lauria
Defensor Público do Estado de Alagoas

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