Defensoria 24horas
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Prefiro escrever sobre temas sobre os quais ouço falar ou presencio. E tenho verificado, na Comarca que titularizo, excessos por parte do Cartório de Registro Civil que considero uma afronta a direitos da personalidade das pessoas mais carentes.
Pois bem. Certa feita, chegou à sala da Defensoria do Fórum de União dos Palmares uma senhora, já idosa, aos prantos. Havia ido com a mãe da recém-nascida, registrar a sua neta: Cauane.
Entretanto, o Oficial Registrador lhe disse que este nome não era permitido por ser estrangeiro e que não iria registrar a criança.
Humildemente, a senhora retrucou: “se não pode ser Cauane, então coloque Karine”. Saiu de lá com o registro de sua neta em mãos: Rosa Maria.
É isso mesmo, caros leitores. Eu também não entendi nada! O Oficial Registrador, havia, simplesmente, escolhido o nome do bebê.
Foi desconcertante ver o rosto da avó, desfeito em lágrimas, tentando me explicar que, por não saber ler bem e enxergar pouco, só havia percebido aquilo ao chegar em casa.
O nome de alguém é um atributo da sua personalidade. Por este nome, ele vai ser conhecido pelos seus pares e vai ser individualizado perante a comunidade.
Os pais, muitas vezes, têm em mente o nome dos filhos desde antes destes serem gerados. Muitos deles, carregados de significado para àquela família.
Como pode então, alguém de fora, que não tem nenhuma espécie de relacionamento com a família ditar o nome dos filhos alheios?
É importante frisar, que a Lei de Registros Públicos limita, um pouco, a discricionariedade dos pais ao registrar os filhos com este ou aquele nome.
O parágrafo único do art. 55 da lei 6.015/73 estabelece que o os Oficiais do Registro Civil não devem registrar prenomes suscetíveis de expor ao ridículo os seus portadores. Mas, ainda neste caso, ou seja, se acharem que o nome escolhido pelos pais pode expor o indivíduo a vexame, deverão levantar um procedimento de dúvida ao juiz.
Melhor explicando: quando o pai ou a mãe não entenderem, realmente, que o nome escolhido pode envergonhar os seus filhos futuramente, neste caso o registrador tem que submeter o caso ao juiz da comarca, para ele decidir se o nome é constrangedor ou não.
Atitudes como a do Oficial Registrador realmente me assustam.
Revelam um total desrespeito pela Lei e pelos procedimentos nela fixados. Imaginei-me nascendo por estes dias na Comarca de União dos Palmares… Se Cauane não pode, imaginem Hayanne, com H, Y e NN??? Provavelmente eu seria Ana, Maria, Alice, a depender da inspiração do registrador no dia.
Vale chamar atenção para o fato de que o nome pode ser modificado. Não é verídica a informação de que o nome será “carregado” para sempre. Na verdade, escolhemos o nosso nome por omissão. Surpresos? Eu explico:
O art. 56 da Lei de Registros Públicos autoriza qualquer pessoa, independentemente de justificar o motivo, a alterar o seu pré-nome (os sobrenomes não podem ser modificados), desde que isso seja feito no intervalo dos 18 até os 19 anos. Depois desse prazo, a alteração só será possível mediante uma razão plausível.
Senhores, vocês têm o direito de escolher o nome dos seus filhos. Desde que este nome não cause vergonha a ele. E só quem pode decidir isso, em caso de recusa do oficial do Cartório, é o juiz, por meio de um procedimento simples, que deve ser realizado pelo próprio Oficial – Procedimento de Dúvida, previsto no art. 55, parágrafo único da Lei 6.015/73, sem qualquer cobrança.
O que é intolerável mesmo é que alguém imponha qualquer nome aos seus filhos. Não aceitem!
No caso verídico aqui relatado, como o estrago já estava feito (Cauane já era Rosa Maria), ingressei com uma ação de retificação de registro civil e estamos aguardando ainda decisão judicial.
Até breve,
Hayanne Amalie Meira Liebig
Defensora Pública de Alagoas