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As eleições não acabaram em Alagoas. Isso porque a Polícia Federal, o Tribunal Regional Eleitoral (TRE) e o Ministério Público Eleitoral (MPE) investigam, em sigilo, esquemas de corrupção de todas as proporções, envolvendo 15 prefeitos, reeleitos ou não, além de um volume de 300 denúncias. Cento e cinqüenta inquéritos foram abertos, só na PF, vindos da Ordem dos Advogados do Brasil, seccional Alagoas (OAB/AL), quase todos do interior de Alagoas.
Muitas denúncias foram gravadas em DVD, como é o caso das eleições em Campestre, a 120 quilômetros de Maceió. Era o mês de junho quando o então candidato à Prefeitura, Amaro Gilvan de Carvalho, o Gilvan “Cabeção” (PT do B), que ganhou em outubro as eleições, sentado em uma mesa, tenta convencer um filho de outro concorrente à Prefeitura, Gervásio Oliveira (PSDB), a desistir da disputa.
Na reunião, gravada com uma câmera escondida pelo filho de Gervásio e que foi exibida na cidade dias depois, Gilvan “Cabeção” está preocupado com Lúcio Santos, outro candidato a prefeito registrado no Tribunal Regional Eleitoral (TRE) de Alagoas como “Lúcio Meu Povo” (PR). O avanço dele nas pesquisas é motivo de inquietação. “Cabeção” apela para o filho de Gervásio: oferece uma “proposta financeira superboa” e anota os valores em uma folha de papel.
“Cabeção” tenta de tudo. Tudo mesmo. Prontifica-se até a chamar deputados estaduais para assinar um acordo no papel. Ele quer passar 20 anos na Prefeitura. A esposa de Gilvan tenta iniciar a conversa, mas Gilvan interrompe: quer ser “objetivo” e mostra como é tratada a coisa pública.
“Empresta-me uma caneta e um papel por favor. Vamos fazer uma coisa você me apóia prefeito e a gente faz todo tipo de acordo. Mas hoje eu queria conversar com você o seguinte: se dava pra gente sentar com Gervásio, eu você e Gervásio, haver uma negociação a gente passa 20 anos nessa prefeitura e nunca mais perde ela; hoje nós temos tudo pra pegar essa Prefeitura da mão desse homem, e a gente unir o grupo e passava o tempo que a gente quisesse; a gente nunca mais sai; existe proposta boa financeira que é super bom para ele, mais veja bem, a gente podia ver alguma proposta pra janeiro de X pra seu Gervásio e ai passava o mês de fevereiro não março X isso sem ser, vamos dizer de 50 e 50 em maio e durante os últimos meses 100. Tudo que a gente comprasse na prefeitura material de construção comprava a Josuel. E a gente tem também uma proposta de 500 cestas básicas por mês ai tem Melke, tem Cal, e tem Josué, são três comerciantes que sempre tiveram com a gente. Acordos a gente junta e se ele não quiser suspeitar não confiar agente faz acordo e eles assinam em baixo todo mundo. Tem que ser cumprido não tem mais eleição, é quatro anos sai um e entra outro o compromisso que um tiver com Gilvan tiver com Gilmar no futuro”,explica Gilvan, na gravação. O filho de Gervásio não aceita.
Negociações gravadas em DVD, como o caso de Gilvan, são investigadas, em sigilo. Segundo o superintendente da PF alagoana, José Pinto de Luna, quinze prefeitos estão sendo investigados. “Não é em si exatamente só os prefeitos, mas a situação que eles estão envolvidos. Estamos investigando de tudo por aqui”, explicou.
Há tudo mesmo. Há duas semanas, a PF colocou atrás das grades o prefeito eleito de Porto de Pedras, a 50 quilômetros de Maceió, Rogério Farias (PTB), irmão do deputado federal Augusto Farias (PTB) e do ex-tesoureiro de campanha do ex-presidente da República, Fernando Collor. Rogério é acusado de coordenar um esquema de fraude que pode envolver pelo menos mil títulos de eleitor, todos falsos. Além deles, estão carteiras de identidade, também falsificadas.
O processo corre em segredo de Justiça, mas, de acordo com um dos juízes do TRE, o coração do esquema é obtenção das listas de votação, documentos sigilosos, com todos os dados dos eleitores. Apenas o juiz da cidade, Rivoldo Sarmento, e integrantes do cartório eleitoral tinham acesso a estes dados. O juiz foi preso, acusado de receber propina pelo esquema.
O inquérito da Polícia Federal, que prendeu o prefeito e o juiz e indiciou 19 pessoas já chegou ao tribunal alagoano e será entregue ao Ministério Público Eleitoral para apreciação. “Vai demorar seis meses para ser julgado. Esse é o tempo que a gente acredita”, disse este juiz.
Depois de eleito, não é fácil retirar um prefeito do cargo. As provas têm que ser conclusivas, sem questionamentos. “Tudo está sendo investigado sob sigilo porque existe a suscetibilidade de denúncias falsas contra os prefeitos. Estamos investigando 300 denúncias atualmente”, disse o corregedor do TRE, André Granja.
“Nós investigamos pagamentos de cestas básicas ou em dinheiro ou com material de construção. Não temos idéia quantos prefeitos são investigados. Há casos graves e existe a possibilidade de o quadro eleitoral mudar bastante”, explicou.
Na Câmara, todos contra todos
A derrota de uns e a vitória de outros nas urnas deixou os vereadores de Maceió apreensivos. As denúncias de compra de votos invadem até a disputa pela Presidência do Legislativo Municipal, prevista para dezembro.
O vereador da oposição, Thomáz Beltrão (PT) disse que 15 vereadores, da nova legislatura, compraram votos através do cadastro, em bairros da periferia da capital alagoana. “O PT está reunindo provas, vamos denunciar”. Beltrão perdeu a eleição. “Houve cadastro de eleitores, apesar de toda a fiscalização dos órgãos públicos, que foi importante. Mas, a compra de votos continuou. Muitos casos apenas ouvimos falar. Outros, estamos entrando com representações na Polícia Federal e no TRE", avaliou.
Na Comissão de Combate à Corrupção Eleitoral da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), por exemplo, as eleições não acabaram. 150 denúncias foram entregues a Polícia Federal, a maioria de vereadores do interior. “As eleições não acabaram porque as denúncias de compra de votos continuam. Não vamos descansar enquanto não acabar com os inquéritos. Quem tiver culpa que pague”, disse o presidente da comissão, Paulo Brêda.