Sebastião senta-se no primeiro vagão da montanha russa. Não sabe nem por que resolveu ir —talvez apenas para agradar à família e não a si próprio. O carro começa a se mover e ele verifica a trava de segurança e olha ao redor para identificar alguma irregularidade. Mantém os músculos retesados e verifica se todos...
Sebastião senta-se no primeiro vagão da montanha russa. Não sabe nem por que resolveu ir —talvez apenas para agradar à família e não a si próprio.
O carro começa a se mover e ele verifica a trava de segurança e olha ao redor para identificar alguma irregularidade. Mantém os músculos retesados e verifica se todos os filhos estão seguros.
O vagão sobe , o vagão desce , o vagão rodopia e Sebastião não relaxa. Pergunta a si próprio o que está fazendo ali; pensa se todos os parafusos foram devidamente apertados e se dá conta quão desnecessário é aquilo tudo. Antecipa a curva fechada mais à frente e a subida absurda que o aguarda sadicamente —então ele experimenta um misto de tédio e medo.
Em seguida, olha para sua família e vê todos se divertindo numa catarse emocionante —cabelos ao vento, olhos arregalados e as bocas abertas com sorrisos estampados na cara.
Mais tarde, ao deitar a cabeça no travesseiro, se dá conta o quanto foi carrancudo e duro consigo mesmo em não se deixar levar, nem se permitir simplesmente viver aquele momento de emoção supérflua e sem grandes objetivos, a não ser sentir a mais pura alegria dos que apenas se divertem.
Hoje é a estreia do Brasil em mais uma Copa do Mundo que irei testemunhar —convenhamos, não restam tantas assim. Poderia dar uma de Sebastião: a política me enoja, os próximos 4 anos que nos aguarda sadicamente, os milhões de compromissos diários, coisas a fazer, a conhecer, a resolver, os boletos, não ganho dinheiro algum com a Copa, o Neymar é um chato de galochas, a FIFA é uma máfia, tem também a fome no mundo….
Mas, há muito que eu me permito nesse momento, deixar no comando o meu “eu infantil”, com todas as características que lhe fazem parte: o encantamento com a competição, com a Seleção, o reconhecimento do momento histórico, a idolatria intencionalmente boba, a emoção nas jogadas empolgantes e explosão a cada grito de gol.
Sim, é um espetáculo “no sense” que prende a atenção global com 22 homens de calções correndo atrás de uma bola. Mas, não seria a vida inteira uma sucessão de banalidades quando tudo e todos, “haja o que hajar” , caminham inexoravelmente para o mesmo buraco ?
Acho que acabei viajando um pouco na maionese rebaixando o espetáculo de nossa própria existência para justificar a empolgação infantil na estreia do Brasil na Copa do Mundo. Mas, a verdade é que quase toda a vida tem a imprevisibilidade previsível de uma montanha russa e a competição e imponderabilidade de uma Copa do Mundo. Portanto, deixemos de reflexões rasas e frívolas e vamos ao que interessa:
Sebastião, levante os braços, sinta o vento nos cabelos e grite:
—Vai Brasil !!!